maldito transgressor

maldito transgressor
A hipnose é tão aconchegante...
O costume a inércia...
A responsabilidade em ser inteiro adormecida...
A verdade miando lá fora na chuva...
A Televisão que faz o tempo passar tão rápido e confortável...

Não ouço mais os gritos seus
Não ouço mais os gritos meus
Não ouço mais os gritos
Não ouço mais
Não ouço
Não
Ñ
~

HAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Grotowski

Jerzy Grotowski (1990)(Polónia)

Translated by Thomas Richards e João Garcia Miguel
Performer, com letra maiúscula, é um homem de acção. Ele não é alguém que faz de outro. Ele é um fazedor, um sacerdote, um guerreiro: está fora dos géneros estéticos. Ritual é performance, uma acção conseguida, um acto. Ritual degenerado é um espectáculo. Eu não procuro descobrir algo novo, mas algo esquecido. Algo tão antigo que todas as distinções entre géneros estéticos deixem de ser necessárias.

Sou um professor do Performer (falo no singular: do Performer). Um professor – comono artesanato -é alguém através do qual o conhecimento está a ser passado; o conhecimento deve ser recebido, mas a forma do aprendiz o reconhecer só pode ser pessoal. E como é que o professor, ele próprio, chega ao saber do conhecimento? Por iniciação, ou por roubo. Performer é um estado do ser. Um homem de conhecimento, podemos falar dele referenciando os romances de Castaneda, se gostarmos de romantismos. Eu prefiro pensar em Pierre de Combas. Ou até deste Don Juan, descrito por Nietzsche como um rebelde para quem o conhecimento se apresenta como um dever; mesmo se os outros não o amaldiçoassem, ele sentir-se-ia um desafiador/reformador, um fora da lei. Na tradição Hindu fala-se de vratias (hostes de rebeldes). Vratia é alguém que está no caminho de conquistar o conhecimento. Um homem de conhecimento (czlowiek poznania) tem ao seu dispor o fazer e não ideias ou teorias. O verdadeiro professor – o que é que ele faz pelo aprendiz? Ele diz: faz. O aprendiz luta para perceber, para reduzir o desconhecido ao conhecido, para evitar fazer. No próprio facto de querer perceber, ele resiste. Ele apenas pode perceber depois de fazer. Ele fá-lo ou não. Conhecimento é uma questão de fazer.
 
Perigo e sorte
Quando eu uso o termo: guerreiro, talvez vos remeta para Castaneda, mas todas as escrituras falam do guerreiro. Podem encontrá-lo na tradição Hindu bem como na Africana. Ele é alguém que está consciente da sua própria mortalidade. Se é necessário confrontar-se com cadáveres, ele confronta-os, mas se não é necessário matar, ele não mata. Entre os Índios do Novo Mundo dizia-se que entre duas batalhas, o guerreiro tem um coração suave, como o de uma jovem rapariga. Para conquistar o conhecimento ele luta, porque a pulsação da vida torna-se mais forte e mais articulada em momentos de grande intensidade, de perigo. O perigo e a sorte caminham juntos. Não se tem classe a não ser em frente ao perigo. No momento do desafio surge a ritmização dos impulsos humanos. Um Ritual é um momento de grande intensidade; intensidade provocada; a vida torna-se, então, ritmo. Performer sabe conectar os impulsos corporais à melodia. (A corrente de vida deve ser articulada em formas.) As testemunhas entram, então, em estados de intensidade porque,por assim dizer, elas sentem a sua presença. E, isto é graças ao Performer, que é uma ponte entre a testemunha e este algo. Neste sentido, Perfomer é pontifex, fazedor de pontes.
Essência: etimologicamente, é uma questão de ser, ser sendo. Essência interessa-me porque nada nela é sociológico. É aquilo que não se recebeu dos outros, o que não veio do exterior, o que não é aprendido. Por exemplo, consciência é algo que pertence à essência; é diferente do código moral que pertence à sociedade. Se quebrarmos o código moral sentimo-nos culpados, e é a sociedade que fala em nós. Mas, se actuarmos contra a consciência, sentimos remorsos – isto é entre ti e o teu ser e não entre ti e a sociedade. Porque quase tudo o que possuímos é sociológico, a essência parece-nos ser algo com pouca importância, mas é nossa. Nos anos setenta, no Sudão, ainda havia jovens guerreiros nas vilas de Kau. Para o guerreiro com total organicidade, o corpo e a essência podem entrar em osmose: parece impossível dissociá-los. Mas este não é um estado permanente; não dura muito. Nas palavras de Zeami, é a flor da juventude. No entanto, com a idade, é possível passar de um corpo-e-essência para um corpo de essência. Isto acontecerá como resultado de uma difícil evolução,de uma transmutação pessoal, que é de alguma forma a tarefa de todos nós. A pergunta chave é: Qual é o seu processo? És fiel a ele ou lutas contra o teu processo? O processo é como que o destino de cada um, o seu próprio destino, que se desenvolve dentro do tempo (ou apenas lá permanece – e é tudo). Então: Qual é o nível de submissão ao teu próprio destino? Cada um pode conectar-se com o seu processo se aquilo que fizer for manter-se próximo de si mesmo, se não odiar aquilo que faz. O processo está conectado com a essência e leva-nos virtualmente ao corpo de essência. Quando o guerreiro está num curto período de osmose corpo-e-essência, deverá conectar-se com o processo. Ajustado ao processo, o corpo torna-se não resistente, quase transparente. Tudo estará iluminado, em evidência. Com o Performer, a performance consegue tornar-se próxima do processo.
 
O Eu-Eu
Pode ler-se nos textos antigos: Nós somos dois. O pássaro que debica e o pássaro que observa. Um morrerá, um viverá. Ocupados com o alimento, embriagados com a vida dentro do tempo, esquecemo-nos de fazer viver a parte de nós que observa. Por isso, há o perigo de existir apenas dentro do tempo, e de forma nenhuma fora dele. Sentir-se observado por esta outra parte de si próprio (a parte que está como que fora do tempo) dá-nos outra dimensão. Há um Eu-Eu. O segundo Eu é quase virtual; não é um – em si – olhar dos outros, nem qualquer julgamento; é como um olhar imóvel: uma presença silenciosa, como o sol que ilumina as coisas – e é apenas isto. O processo apenas pode ser conseguido somente no contexto desta presença constante. Eu-Eu: na experiência, o duplo não aparece separado, mas como uma unidade, única.
No caminho o Performer – apercebe-se da essência durante a osmose com o corpo, e depois trabalha-a no processo; ele desenvolve o Eu-Eu. A presença observadora do professor pode por vezes funcionar como um espelho da conexão Eu-Eu (pois esta junção pode ainda não ter sido encontrada). Quando o canal Eu-Eu é encontrado, o professor pode desaparecer e o Performer continua em direcção ao corpo de essência; isto pode ser – para alguém – como aquilo que se observa na fotografia de Gurdjieff, velho, sentado num banco de jardim em Paris. Da fotografia do jovem guerreiro de Kau até à de Gurdjieff acontece a passagem de corpo-e-essência ao corpo de essência.
Eu-Eu não significa estar dividido em dois, mas ser-se duplo. A questão é ser-se passivo na acção e activo na observação (reverter o hábito). Passivo: estar receptivo. Activo: estar presente. Para nutrir a vida do Eu-Eu, o Performer deve desenvolver, não um organismo-matéria, um organismo de músculos, atlético, mas um organismo-canal através do qual as energias circulam, as energias se transformam e o subtil é tocado.
O Performer deve fundar o seu trabalho numa estrutura precisa – fazendo esforços, porque a persistência e o respeito pelos detalhes são o rigor que permitem tornar presente o Eu-Eu. As coisas a fazer devem ser precisas. Não improvise, por favor! É necessário encontrar as acções, simples, tendo, no entanto, o cuidado de que elas sejam dominadas e que perdurem. Se não, elas não serão simples, mas banais.
 
Aquilo de que me recordo
Um dos acessos ao caminho criativo consiste em descobrir dentro de si uma antiga corporalidade à qual se esteja ligado por uma forte relação ancestral. Por isso não se está no personagem nem no não-personagem. Começando pelos pormenores pode descobrir em si um outro – o seuavô, a sua mãe. Uma fotografia, uma memória de rugas, o eco distante de uma cor da voz possibilita a reconstrução de uma corporalidade. Primeiro, a corporalidade de alguém conhecido, e depois cada vez mais e mais distante, a corporalidade de um desconhecido, o antepassado. Será literalmente o mesmo? Talvez não literalmente – mas talvez, como poderia ter sido. Poderá chegar bastante atrás, como se a sua memória acordasse. Este é o fenómeno da reminiscência, como se recordássemos o Performer do ritual primordial. Cada vez que descubro algo, tenho a sensação de que é aquilo que me recordo. As descobertas estão no passado e nós devemos viajar atrás para as alcançar. Com essa descoberta – como que regressando de um exílio – pode alguém tocar alguma coisa que não está ligada aos inícios, mas – e atrevo-me a dizê-lo – ao inicio? Eu acredito que sim. Será a essência o passado escondido da memória? Não faço ideia. Quando eu trabalho próximo da essência, tenho a sensação que a memória se actualiza. Quando a essência é activada, é como se fossem também activadas fortes potencialidades. A reminiscência é talvez uma dessas potencialidades.
 
O homem interior
Cito:
Entre o homem interior e o homem exterior existe a mesma diferença infinita que entre o céu e a terra.
Quando estava na minha primeira causa, eu não tinha Deus, eu era a causa de mim. Aí ninguém me perguntava para onde eu tendia, nem o que estava a fazer; não existia ninguém que me questionasse. O que eu quisesse, eu era, e o que eu era, eu queria; estava livre de Deus e de tudo.
Quando saí para fora (fluí para fora) todas as criaturas falavam de Deus. Se alguém me perguntasse: - Irmão Eckhart, quando é que saíste de casa? – Eu estava ali há um momento atrás, eu era eu mesmo, eu queria-me a mim mesmo e conhecia-me a mim mesmo, para fazer o homem (que aqui por baixo eu sou). É por isso que eu estou por nascer, e pela minha condição de não nascido, eu não posso morrer. O que eu sou pelo meu nascimento morrerá e desaparecerá, porque é dado aotempo e deteriorar-se-á com o tempo. Mas com o meu nascimento também nasceram todas as criaturas. Todas elas sentem a necessidade de ascender da sua vida para a sua essência.
Quando eu regressar, esta descoberta é muito mais nobre do que a minha saída. Nessa descoberta – lá, eu estou acima de todas as criaturas, nem Deus, nem criatura; eu sou o que eu era, e assim devo permanecer agora e para sempre. Quando eu chegar – lá, ninguém me perguntará de onde eu vim, nem onde eu estive. Lá eu sou quem era, não aumento nem diminuo, porque sou – lá, uma causa imóvel, que faz mover todas as coisas.
Nota (que acompanhou o texto “Performer” na brochura publicada pelo Workcenter em Pontedera, Itália): Uma versão deste texto – baseada numa conferência dada por Grotowski – foi publicada em Maio 1987 pela Art-Press em Paris, com o seguinte comentário por Geoges Banu: “O que eu proponho aqui não é uma gravação, ou um sumário, mas sim notas tiradas cuidadosamente, o mais próximas possíveis das fórmulas de Grotowsky. Deverão ser tomadas como indicações para uma trajectória e não como os termos de um programa, nem como um documento – acabado, escrito, encerrado.” O texto foi re-trabalhado e aumentado por Grotowsky para a presente publicação. Identificar Performer com os participantes do Workcenter seria um abuso do termo. A questão está apenas ligada aos vários casos de aprendizagem, de toda aactividade de “professor de Performer”, em que esta raramente ocorre.



 
Foto Divulgação
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Cena da peça I Am America, do polonês Jerzy Grotowski
 
Importante formador de atores, o polonês Jerzy Grotowski (1933-1999) foi responsável por algumas das mais importantes revoluções do teatro no século 20. Com seu conceito de teatro pobre, reduziu a cena ao essencial – iluminação e cenário ficam, portanto, de fora. Neste mês, o Sesc Consolação, em São Paulo, organiza espetáculos, conferências e exibições de filmes sobre o trabalho do diretor

1) É fazendo que se aprende
Depois do ator russo Constantin Stanislavski, ninguém mais explorou a natureza da arte do ator tão profundamente quanto Grotowski. Esta é a opinião do diretor de teatro inglês Peter Brook. O polonês priorizava a pesquisa. Seu objetivo deixou de ser o espetáculo. “Os ensinamentos dele iluminam meu trabalho artístico”, diz Celina Sodré, diretora da companhia carioca Studio Stanislavski. O encenador polonês, com quem ela teve contato nos anos 80, mudou sua vida. “Devo a ele praticamente tudo que sei sobre a arte do ator e da direção teatral.” Para Celina, o principal legado do diretor resume-se numa de suas frases: “O conhecimento é uma questão de fazer”.

2) Em cena, apenas o essencial
Nada de cenário, iluminação, trilha sonora, figurino ou qualquer outro artifício que não seja primordial à cena. O ator diante de seu espectador e ponto final. Principalmente na fase inicial de seu trabalho, assim devia ser o teatro segundo Grotowski, resumido na expressão “teatro pobre”. “Grotowski criou talvez o único teatro de vanguarda em que a pobreza não é um inconveniente. A falta de dinheiro não é uma desculpa para o emprego de meios inadequados, que sabotam experiências”, declara Peter Brook em Avec Grotowski (“Com Grotowski”, sem tradução no Brasil), livro em que relata sua convivência com o encenador polonês. Ao longo de sua trajetória, Grotowski reviu este conceito. “Mas seus estudos continuaram pautados pela essencialidade da cena”, afirma o principal seguidor do diretor, o norte-americano Thomas Richards, hoje à frente do Workcenter of Jerzy Grotowski and Thomas Richards, centro de pesquisa e criação teatral fundado na Itália em 1986.

3) Livre-se de amarras físicas e psicológicas
Peter Brook costuma servir-se de uma parábola japonesa para definir a pesquisa de Grotowski. Conta a história de um monge cuja ambição era desenhar um círculo perfeito. Depois de praticar durante anos, escalar montanhas e recorrer a dois mestres em busca de uma solução, um sábio estende seu dedo sobre um pequeno nervo nas costas do monge e lhe diz: “Este é seu problema”. Segundo Brook, Grotowski consagrou a vida à procura da chave que liga o círculo perfeito ao pequeno nervo. “Ele buscava a relação entre as energias internas do corpo e suas expressões exteriores.” Thomas Richards destrincha mais didaticamente a pesquisa de seu mestre. “Um ator é seu próprio instrumento de trabalho”, diz. O ator só pode entregar-se inteiramente à cena depois de livrar-se de qualquer tipo de bloqueio, físico ou psicológico.

4) Torne visível o invisível
Grotowski é considerado místico e seu teatro tem fama de ser sagrado. Segundo Peter Brook, “o teatro de Grotowski é sagrado, pois seu objetivo é sagrado”. Em sua pesquisa, o diretor polonês se propõe a ultrapassar a comunicação racional. Ele não buscava a interpretação em cena, mas uma ação mais profunda e fundamental do que a emoção, algo que fosse tão vital quanto a própria vida. Ao evocarem cantos e danças ancestrais, alguns exercícios realizados por seus atores se assemelham a cerimônias ritualísticas. A equação divina, capaz de tornar visível o invisível, nada mais é do que a soma das energias mais primárias do ator, de sua entrega total em cena e das faíscas energéticas geradas por seu encontro com o espectador.

5) Seja verdadeiro no palco
Grotowski desenvolveu os estudos de Stanislavski sobre a arte do ator. Enquanto o diretor russo trabalhava com base em ações concretas, Grotowski buscava a força geradora destas ações, os movimentos não cotidianos, ligados a forças primitivas. Ele não estava interessado na técnica de um ator, mas na sua capacidade de transformar a representação teatral num ato verdadeiro. Para Thomas Richards, a chave reside em fazer do palco um campo de ação. “Não interprete, aja. As emoções reagem naturalmente às ações”, ensina. “Grotowski não pergunta como fazer, mas como liberar no corpo aquilo que o torna extremamente vivo, orgânico, potente e poético”, complementa o ator Renato Ferracini, integrante do Lume Teatro, grupo de Campinas cuja arte é influenciada pelos estudos do diretor polonês.

6) Menos forma e mais substância
Em 1986, durante um workshop de que Richards participou, Grotowski destacou uma das participantes pelo preciosíssimo (preciosismo?) de sua técnica. Dentre todos os que estudavam ali, ela era a que melhor sabia como estruturar uma cena. Segundo conta Richards, seus movimentos traduziam intenções de forma bastante clara. Ao término do workshop, Grotowski foi contra a inclusão da atriz no centro de estudos que ele dirigia. Concluiu que, apesar do talento raro, ela não fazia teatro para se desenvolver. Seu objetivo era brilhar em grandes espetáculos teatrais.
Para o diretor polonês, a técnica não era essencial. Ele via o teatro como veículo de busca espiritual.

7) Elimine a divisão entre palco e plateia
Grotowski foi revolucionário ao explodir os limites da cena, inserindo o espectador no ato criativo. O público deveria participar ativamente da montagem e, a cada criação, a relação palco-plateia precisava ser repensada. Em uma das mais célebres peças que o polonês dirigiu, Akropolis (1962), de Stanislaw Wyspianski, público e elenco se misturavam para encarnar prisioneiros de campo de concentração, confinados num crematório. “Grotowski fez com que o conceito de cenografia se ampliasse e se desconstruísse. O palco desapareceu e surgiu a ideia de uma sala vazia onde, a cada espetáculo, tudo é redimensionado”, explica Celina Sodré.

8) Quem conduz o movimento é o corpo, não a mente
Quando iniciou seus estudos com Grotowski, Richards se considerava o pior dos aprendizes. Tentava fazer cenas intensas na esperança de se sobressair. A relação com o mestre sofreu uma transformação quando, certo dia, o diretor observou seu andar em cena. “Ali havia organicidade”, disse-lhe o polonês. “Mas eu só estava andando de um lado pro outro”, respondeu Richards, então com pouco mais de 20 anos. “Você estava andando para alguém. Seu andar tinha intenção”, replicou o encenador. O discípulo de fato revisitava uma recordação. Tinha caminhado daquela forma quando, ainda criança, levou um presente ao seu pai no hospital. Compreendeu então o movimento natural do corpo. “A organicidade está quase sempre bloqueada por uma mente que tenta conduzir o movimento, dizendo ao corpo o que ele deve fazer e de que forma”, explica ele.

9) Não basta ser espectador, tem que participar
Grotowski queria retirar a plateia da posição de passividade e anonimato à qual estava habituada. Em A Sala de Estar, espetáculo criado por Thomas Richards com base na pesquisa do diretor polonês e que pode ser visto em São Paulo até dia 12, o espectador comporta-se como uma visita. Como o título da peça sugere, a obra se desenrola numa sala de estar. “Antes de ser convidado a entrar, o espectador recebe uma instrução: deve trazer algo para comer ou beber. Depois, age como se participasse de uma reunião entre amigos”, explica Richards. Acomoda-se em pufes e sofás e participa de uma espécie de cerimônia, na qual seis atores declamam textos evocando forças da natureza e entoam canções africanas e caribenhas. Assim, o espectador conquista sua individualidade em cena e contribui para o espetáculo com sua presença e com o fluxo de energia que troca com os intérpretes.

10) Abra-se para encontros reais
“Não se trata de instruir um aluno, mas de se abrir completamente para outra pessoa”. Assim Grotowski definia sua atuação como professor. Buscava o mesmo tipo de encontro entre ator e espectador. “Ele tinha uma capacidade rara de prestar atenção nas pessoas, de se entregar como ninguém”, explica ele, dando como exemplo o primeiro workshop que realizou com Grotowski. Na ocasião, depois de o grupo mostrar cenas nas quais estava trabalhando, o diretor chamou e conversou por cerca de quatro horas com cada ator. “Ele quis saber tudo sobre minha vida. Nunca fui entrevistado de maneira tão completa por ninguém.”

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domingo, 11 de agosto de 2013

Acima do Além!




Os acrobatas


Subamos!
Subamos acima
Subamos além, subamos
Acima do além, subamos!
Com a posse física dos braços
Inelutavelmente galgaremos
O grande mar de estrelas
Através de milênios de luz.

Subamos!
Como dois atletas
O rosto petrificado
No pálido sorriso do esforço
Subamos acima
Com a posse física dos braços
E os músculos desmesurados
Na calma convulsa da ascensão.

Oh, acima
Mais longe que tudo
Além, mais longe que acima do além!
Como dois acrobatas
Subamos, lentíssimos
Lá onde o infinito
De tão infinito
Nem mais nome tem
Subamos!

Tensos
Pela corda luminosa
Que pende invisível
E cujos nós são astros
Queimando nas mãos
Subamos à tona
Do grande mar de estrelas
Onde dorme a noite
Subamos!

Tu e eu, herméticos
As nádegas duras
A carótida nodosa
Na fibra do pescoço
Os pés agudos em ponta.

Como no espasmo.

E quando
Lá, acima
Além, mais longe que acima do além
Adiante do véu de Betelgeuse
Depois do país de Altair
Sobre o cérebro de Deus

Num último impulso
Libertados do espírito
Despojados da carne
Nós nos possuiremos.

E morreremos
Morreremos alto, imensamente
IMENSAMENTE ALTO. 


VINICIUS DE MORAES.



E nesse impulso de altos mergulhos em momentos anteriores, de pesquisas anteriores com as experimentações anteriores (2007/ 2008/ 2009) no estado persona em ação ( Com a querida Silvana Abreu ) cara a cara com público, eis que esbarro com um inspirador anterior. Coloquei na página de rosto do celular - O Artísta Plástico Julio Le Parc sobre o dever dos Arístas:





quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Loucura e Arte



Loucura e Arte

E o que é a arte, se também como a loucura ainda se busca uma definição, e, dentre centenas, nenhuma satisfaz plenamente a todos. Em seu livro Arte é o que eu e você chamamos Arte, Frederico de Morais nos apresenta 801 ( oitocentas e uma )definições de Arte , sem contudo esgotar as possibilidades de defní-la.
Para Picasso por exemplo, “ A arte é a mentira que nos ensina a ver a realidade.”
Poderíamos dizer que a arte é uma forma particular de “ver” a realidade. É mentira no sentido de que está no mundo das idéias, da palavra, da cor, da forma e que usadas como símbolos tenta uma elucidação do pensamento , uma representação do real.
 
 
 
 
 

Por que meandros passam os processos criativos do artista? Segundo Freud “o escritor reajusta seu mundo de uma nova maneira, que lhe agrade e portanto é capaz de criar um mundo próprio.” Creio podermos aplicar este pensamento para qualquer área da criação artística.
Há algum tempo que temos conhecimento de que a pintura, a escultura, o desenho e a música têm feito parte de processos terapêuticos em alguns casos de doenças mentais (paranóia, hebefrenia e catatonia), cujo suporte é orgânico ,e que se referem aos distúrbios da personalidade como um todo, e das neuroses ,que se referem apenas a um setor da personalidade, sem contudo comprometer a estrutura do pensamento, do contato afetivo com o meio e da sua consciência crítica.
O indivíduo para ser considerado normal depende de comparações com o que é considerado anormal . Portanto ,o parâmetro para medirmos o normal é a anormalidade. Mas o que é a anormalidade? Sabe - se que, muitas vezes a linha que separa o normal do anormal é muito tênue.
Mas aqui estamos nos referindo as patologias cujo suporte é orgânico e envolvem a perda do contato com a realidade, ou seja, que se relacionam com os processos delirantes.
Mas se a arte é produto de uma forma particular de “ver “a realidade, mas sem contudo estar em outra realidade, ou de “ver”, mas sem estar vivendo nela, o que um louco faz é arte?
No Brasil, nos anos trinta, um grupo de artistas que se denominavam CAM (Clube dos Artistas Modernos), dentre eles o polemico Flávio de Carvalho, promoveu trabalhos pioneiros, como exposição de desenhos de crianças e de doentes mentais.
Na França, o pintor Dubuffet, pesquisando no anos 40 este tipo de obra a chamou de Art Brut ( arte bruta), uma alusão ao comércio do vinho, onde um vinho bruto é um vinho não contaminado. Para ele então, a arte do louco seria uma arte pura, não “contaminada” pela cultura. Existe realmente esta possibilidade ?
No final dos anos 70, o pesquisador inglês Victor Musgrave, surpreendeu a Europa com uma grande exposição na Hayward Gallery em Londres, a qual chamou de “Outsider” (algo em torno de estranho ou marginal), onde todos os trabalhos foram feitos por portadores mental.
Musgrave reconhece que nem todo trabalho tenha um valor artístico, assim como muitas pessoas ditas normais, desenham, pintam, esculpem, ou mesmo estudam arte, mas não são capazes de produzir um objeto artístico.
 
 
 
 

 
 


 

Pensado desde 1946, mas só se tronado uma realidade em 1952, o Museu do Inconsciente, iniciativa brasileira única no mundo a qual devemos a médica psiquiatra Nize Magalhães da Silveira, vem atraindo a curiosidade, admiração e questionamento de estudiosos e artista do mundo inteiro.
Com tudo, Dr. Nize dizia “aqui não existem artistas, mas pessoas que expressam seu mundo interno. A estética porem, prosseguia ela, não é incompatível com a ciências – e, se algum dos pacientes for considerado artista, ótimo,” Para alguns críticos muitos assim já o foram considerados. Mas no entanto há uma resistência no mundo todo para não se considerar arte o trabalho dos loucos.
Numa entrevista concedida à Revista Veja em 18/09/1981, Victor Musgrave afirmou que, muitos Museus como a Tate Gallery de Londres, já possuem em seu acervo muitas obras de loucos, mas não as expõem.
Por que? Preconceito? Fica a pergunta.
Nos anos 90, comparado a Marcel Duchamp, Arthur Bispo do Rosário, ex marinheiro e interno da colônia Juliano Moreira por meio século, e que morreu em 1989, foi considerado um gênio quando seus trabalhos foram exposto na Bienal de Veneza.
Para o Professor Rui Chamone Jorge, pode se estabelecer semelhanças, diferenças e destino dos objetos artísticos e terapêuticos. Dentre suas proposições está a de que “ o objeto artístico parte de um impulso criador selecionado e o objeto terapêutico parte de um impulso orientado pela intuição, dirigido à sensibilidade, quando não há seleção de estímulos.”
Para alguns ,o artista bruto não deve ser simplesmente definido como louco, mas deve ser incluido no grupo das minorias.

No jornal O Globo de 10 de outubro de 2000,o crítico de arte e ensaísta Luiz Camillo Osório é tachativo ao afirmar “ que não há nada mais fora de moda do que ficar pontificando se tal coisa é arte ou não. Todavia, algumas vezes tais distinções são necessárias.(...)Por mais emocionante que seja uma pintura de Fernando Diniz, ou mesmo o manto do Bispo do Rosário, aquilo não é arte.(...) Sem conciência, sem intencionalidade não se faz arte.”
Mas se os conceitos de arte na modernidade ampliaram seus limites, se Aristóteles já afirmava que a arte nem sempre está ligado ao belo e se algo nos toca e nos coloca em um estado de sublime contemplação, mesmo assim será necessário un atestado de sanidade para o autor de uma obra para que esta seja considerado arte?


Fotos - Beto de Faria



Nem arte, nem loucura


O verbo surtar ganhou status e glamour. Hoje em dia todos surtam. É a moda
 


 
A sociedade apropriou-se da loucura como um bem descartável, banindo o que havia de sagrado e maldito nesse estado alterado de consciência. Empanturrou-se de drogas, de medicamentos, de álcool e fumo. E também de psicanálise. Na derrapada, confundiu o estado de transe criador com o delírio esquizofrênico, o jejum da ascese com a anorexia nervosa, a náusea existencialista com a bulimia das modelos de passarelas. A fantasia de que os artistas são seres fragmentados é própria de uma sociedade com rupturas.
Os poetas buscaram o absoluto, um fluxo permanente de criação a custo de trabalho e sofrimento. Nietzsche não escreveu delirando, Schumann não compunha em surto psicótico, nem Van Gogh pintava quando estava alterado. Os Upanishads, textos sagrados do povo indiano, definem o vazio que antecede o ato criador como um instante de comunhão com o ser: “O mais alto estado se alcança quando os cinco instrumentos do conhecer permanecem quietos e juntos na mente, e esta não se move.” Êxtase, iluminação, revelação ou inspiração, qualquer nome que se queira dar a esse estado, não corresponde à loucura. Ao contrário, é puro saber. O poeta inglês Wordsworth escreveu que “a poesia é emoção relembrada em tranquilidade.” O mesmo pensou Freud quando afirmou que no ato criador há um fluxo de ideias e imagens que jorram do inconsciente, mas são polidas pelo consciente.
Na era moderna, o artista desprezou a natureza coletiva da criação, assumindo um exacerbado individualismo. Atribuiu a si próprio a única responsabilidade por sua arte e nomeou-se “criador”, epíteto antes usado apenas para designar os deuses. A autoria virou a marca do nosso tempo.
Os pintores zen-budistas não assinavam suas aquarelas porque acreditavam que elas só adquiriam existência ao serem contempladas. Qualquer pessoa que a olhasse se tornava o autor, pois a reinventava a partir daquele instante de contemplação, conceito filosófico vago para a nossa mente ocidental monoteísta, que atribui a criação do mundo a um Ser único. A modernidade buscou assinaturas onde elas não existiam, em trabalhos reconhecidamente coletivos, de mestres e discípulos. Os afrescos italianos pintados por confrarias de artesãos tornaram-se obras exclusivas de Giotto, Duccio, ou Pisanello. Apagaram-se os nomes dos pintores especialistas em mãos, pés, olhos, douramentos, pregas de mantos, molduras, que trabalharam em paredes de igrejas e palácios, acreditando que bem melhor do que sonhar uma obra de arte é realizá-la. Buscou-se a assinatura do criador único, por mais oculta que ela se encontrasse, sob camadas de tinta.
Entre as nações tribais, bastava que um membro se desgarrasse dos costumes para ser punido com a expulsão ou a morte. A mitologia está repleta de heróis que padeceram na luta pela individuação. Quando uma sociedade se confronta com um artista, ela tanto pode aliená-lo de sua coletividade, como elegê-lo seu representante. Ao mesmo tempo em que ela cobra dele que rompa com as regras, transgredindo, extrapolando, derrubando muros, pune-o por essas transgressões.
Surge a figura moderna do artista neurótico, perplexo e fragilizado, que não distingue o eterno do descartável, porque também não lhe interessa essa distinção. Tudo é consumido numa velocidade alucinante. O novo envelhece em poucas horas, criam-se novos simulacros, as prateleiras são repostas. O artista se transforma em fabricante de escândalos, em alucinado. Confunde-se arte e produto, poesia e escracho, êxtase e exposição da imagem. E o atributo de loucura serve apenas à ambígua função de justificar o artista ou execrá-lo.
 
Ronaldo Correia de Brito (Autor de Livro dos Homens)

sábado, 3 de agosto de 2013

Papo e impressões

 
 
AMOR TALHADO - ENSAIO ABERTO
 
 
 
 


Dia 30 de julho fizemos nosso primeiro ensaio aberto do processo de "AMOR TALHADO". Foi mais uma oportunidade para pensarmos e trocarmos sobre a peça e os temas.





É encantador ver uma idéia sendo construída e provocando críticas, reflexões, cumplicidade, questionamentos... 

É um lapidar constante que cada vez mais vai sendo acrescido de sensibilidades de novas mãos e olhares que potencializam essa tradução poética pra um comunicar mais simples e preenchido.



 
 
 
O mais significativo pra mim é ir conseguindo, passo a passo, tocar os simbolos que escolhemos com a ajuda de tanta gente boa que foi entendendo o que eu precisava viver em cena e, mais importante que isso, o que a cena precisava que eu vivesse, (risos).
 
Foram incríveis os retornos e fico com a sensação de uma primeira abertura muito honesta pois as dificuldades, os apontamentos a serem aprofundados e as luzes do processo foram muito bem vistos pelos convidados que traduziram muito claramente em suas palavras o que estamos vivendo.
 
Tivemos a oportunidade de expor também a costura desse caminho que vem se fazendo num diálogo profundo das diferentes vivências dos envolvidos no processo.
 
E aí vou sentindo que vem tudo confluindo pra esse desembocar próximo onde a vivência aconteça, que sejamos passagem livre mesmo e cada um possa receber, fazer sua leitura e ter sua vivência com aquele conteúdo. 
 



Cada um que vem chegando com seus olhares sensíveis fotografando, produzindo, falando, filmando, pintando, instigando, construindo, parafusando, escrevendo, questionando, abrindo espaços, filosofando, vai trazendo novas peças dessa obra.

Sou muito agradecido aos novos parceiros; aos queridos que passam rapidinho mas deixam suas provocações; ao meu Mestre Simioni que começou tudo isso comigo e segue me provocando e ferramentando; à Casa das Caldeiras, à minha equipe mega ultra escolhida de coração: Daniele Sampaio, Luciano Lucko, Anna Kumamoto, Beto de Faria, Felipe Barros, Marcel Gilber, Juh Leidl e Bruno Mello; à Diretoria que já virou família, hahahahahaha, Cristiano Karnas (Diretor) e Larissa Salgado (Assistente de Direção e Diretora de Arte). Fechamos mais um ciclo e seguimos rumo à estréia!


"O seu solo tem um tom do sagrado. Não o sagrado religioso, mas sim o sagrado das nossas memórias"  Beto de Faria (Vídeo-Artísta/ Performer)