A hipnose é tão aconchegante... O costume a inércia... A responsabilidade em ser inteiro adormecida... A verdade miando lá fora na chuva... A Televisão que faz o tempo passar tão rápido e confortável...
Não ouço mais os gritos seus Não ouço mais os gritos meus Não ouço mais os gritos Não ouço mais Não ouço Não Ñ ~
Buscando referências textuais que sugerissem movimento eis que cruzo com o poeta croata:
Radovan Ivsic
METEOROS
1
Sombria, ela está no vazio. Seu dedo desperta, hesita, depois torna-se peixe.
Todo seu corpo se alumia. É o nevoeiro, diz para si mesma.
2
Pesada, no turbilhão, ela é apenas uma ferida. Um grito entreabre sua boca mas
os dedos de seus pés são borboletas e alçam vôo. É o relâmpago, diz para si
mesma.
3
Vermelha, ela se assusta: não são mais as escamas que recobrem seu corpo mas os
lábios tão pequenos, inumeráveis. Ela se envolve num lençol branco. É a neve,
diz para si mesma.
4
Trêmula, ela avança em direção ao abismo embora ela gostaria de fugir. Não é um
abismo, é um abutre que se precipita em direção à ponta nua de seu seio. É a
miragem, diz para si mesma.
5
Citadina, ela tem o segredo para abrir as jaulas. Com o primeiro tigre, ela
desce no metrô. Em pouco tempo, estão no deserto. As ampolas se apagam mas no
escuro dois olhos verdes não tardarão a se iluminar. É o eclipse, diz para si
mesma.
6
Ofegante, ela atingiu o cume da mais alta falésia. De repente, atrás de um
rochedo, ela percebe um olho e depois um outro: milhares de pupilas ávidas
fixam-se sobre ela. Rápida, ela começa a se despir. Nua enfim, ela avança em
direção à encosta abrupta, ervosa, e desce até a planície fazendo a roda. É o
ciclone, diz para si mesma.
7
Noturna, no musgo ela descobre as estrelas, os traços de um cervo e enfim uma
fonte. Um arminho em fuga se esconde em sua axila. É o cometa, diz para si
mesma.
8
Invejosa, ela
vê o dorso de um desconhecido que se observa no espelho. Sob o travesseiro, ela
pega um machado e o lança em direção à fria superfície para aniquilar sua
profundidade enganosa. O desconhecido se desvia e a desfigura para ver sua nova
imagem, talvez. Não. É o
terremoto, diz para si mesma.
Como diria um bailarino amigo: "parece dançar Butoh com o lápis". Texto que inspira o corpo.
Tivemos um ensaio aberto recentemente com a presença do Diretor e Dramaturgo Alexandre Dal Farra. Foi muitíssimo interessante ter retornos do ponto de vista de alguém que pensa dramaturgia e lida tão bem com textos para gerar conflitos e movimentos. Provocados justamente à abrirmos mãos dos textos antigos para mergulharmos no "tecer" dos desequilíbrios físicos, iniciamos essa pesquisa mais profunda de que Textus (que originalmente tinha o significado de “material tecido”, do verbo texere, “tecer”) terá essa peça.
“Nós partimos sempre de um erro, mas todo o segredo que está nisto é que, depois, nós podemos corrigir a trajetória. E é na correção da trajetória que começa a verdadeira competência. Sim, mas eu repito: não é que uma metafísica conduza a uma técnica; é uma prática que leva a uma sabedoria”. Grotowski
Segue abaixo a reprodução do capítulo dedicado a Jerzy Grotowski no livro “A aprendizagem do ator” de autoria de Antonio Januzelli Janô. Excluindo radicalismos a que os princípios de Grotowski possam levar, esta é a proposta teatral em que acredito.
ALGUNS PRINCÍPIOS Grotowski advoga o ator “santo” - aquele indivíduo que se engaja a na investigação de si mesmo para se tornar um criador. Esse engajamento exige dele a destruição de todos os estereótipos, até aflorar sua verdade pura. Para Grotowski, o teatro tem certas leis objetivas, e a sua realização só é possível quando respeitadas essas leis. O grande trunfo do teatro é ser um ato gerado pelo contato entre pessoas, o que o configura como um evento também biológico. A realidade do teatro é instantânea, no aqui-e-agora, e executada no próprio organismo do ator frente ao espectador, condições essas que fazem tal arte impossível de ser reduzida a meras fórmulas. A relação do ator com o espectador no teatro de Grotowski torna-se
uma relação física, ou melhor, fisiológica, no qual o choque dos olhares, a respiração, o suor [...] terão participação ativa.
Do ator é exigido o desenvolvimento de uma anatomia especial, resultante da eliminação de toda resistência do corpo e qualquer impulso psíquico. O ato da criação teatral para o mestre polonês nada tem a ver com o conforto externo ou com a civilidade humana convencional, mas com o instinto despertando e escolhendo espontaneamente os instrumentos de sua transformação, numa luta do ator contra os seus bloqueios, atrofiamentos e condicionamentos. O que terá importância nesse processo é a operação de um trabalho interior intenso, pois o teatro só tem significado se o homem puder experimentar o que é real e, “tendo já desistido de todas as fugas e fingimentos do cotidiano, num estado de completo e desvelado abandono”, descobrir-se. O desejo de Grotowski é liberar as fontes criativas do homem, reconstituindo-lhe “a totalidade da personalidade carnal psíquica”. Nessa caminhada, o papel será um instrumento para o ator fazer uma incisão em si mesmo, investigando tudo o que está oculto em sua personalidade. A moralidade nessa etapa significa expressar a verdade inteira, não esconder o que for básico, não importando se o material é moral ou imoral, pois a primeira obrigação do artista é expressar-se através de seus próprios motivos pessoais e correr riscos, pois não se podem repetir sempre os mesmos caminhos. A chave mestra desse processo é o reconhecimento do material vivo, constituído pelas associações e recordações do ator, que deverá reconhecê-las não pelo pensamento, que impõe soluções já conhecidas, mas através dos seus impulsos corporais, tornando-se consciente deles, para dominá-los e organiza-los; com o tempo, ele sentirá que o seu corpo começa a reagir totalmente, que não oferece mais resistências, que seus impulsos estão livres... mas nessa experiência é necessário galgar “degrau por degrau, sem falsidade, sem fazer imitações, sempre com toda personalidade, com todo o corpo”. O MÉTODO DA SUBTRAÇÃO A via negativa
“O processo criativo consiste [...] em não apenas nos revelarmos, mas na estruturação do que é revelado”.
O que Grotowski chama de “método” é exatamente o oposto de “prescrições” – o ator aprender por ele mesmo suas limitações e bloqueios e a maneira de supera-los; algo o estimula e ele reage, mas as reações não devem ser procuradas, só valerão se forem espontâneas. Para Grotowski todo método que não se abre no sentido do desconhecido é um mau método, e que todos os exercícios que constituem uma resposta à pergunta Como se pode fazer isso? devem ser abolidos. O processo que ele propõe é o da “via negativa”: O que é que eu não devo fazer? Com uma adaptação pessoal dos exercícios devem-se encontrar soluções para eliminação dos obstáculos, que variam de um indivíduo a outro; sempre são sugeridos ao ator exercícios que induzam a uma mobilização psicofísica, objetivando eliminar tudo que seja seja fonte de distúrbios à suas reações. É imprescindível que ele tenha condições de trabalhar em segurança, que sinta que pode fazer tudo, que será compreendido e respeitado por seus companheiros. “Não se lhes inculca um saber fazer. Eles precisam encontrar um saber ser”. Deve ser claramente estabelecido para cada ator aquilo que: ¬ bloqueia suas associações íntimas e ocasiona sua falta de decisão; ¬ descoordena sua expressão e disciplina; ¬ o impede de experimentar o sentimento de sua própria liberdade. Nenhum exercício deve ser feito superficialmente; eles são elaborados pelos atores e adotados de outros sistemas, estabelecendo-se nomes para cada um a partir de idéias e associações pessoais, devendo o ator justificar cada detalhe do treinamento com uma imagem precisa – real ou imaginária. Os exercícios servem para a pesquisa, e não como mera repetição, e devem ser realizados dinamicamente através da busca de contatos concretos – a recepção de um estímulo do exterior e a reação a ele, com todo o corpo participando da ação. É regra essencial que tudo venha do corpo e através dele, devendo existir uma reação física a cada coisa que afeta o ator, que deve banir todas as formalidades do seu comportamento, erradicando tudo o que não harmonize com seus impulsos, respeitando integralmente o processo natural fisiológico, que nunca deverá ser restringido por sistemas ou teorias impostos. É necessário o ator fazer um exame geral diário de tudo o que se relaciona com seu corpo e sua voz, e tudo o que for realizado
deve ser sem pressa, mas com grande coragem [...] com toda a consciência, dinamicamente, como resultado de impulsos definitivos.
Para que tudo atinja um resultado, a espontaneidade e a disciplina são aspectos básicos. O AUTODESVENDAMENTO É o ato baseado num esforço de total sinceridade, exigindo do ator renúncia “a todas as máscaras, mesmo as mais íntimas e necessárias ao equilíbrio psíquico”. Esse ato de desvendamento do ator se processa através do encontro consigo mesmo, por meio de um extremo confronto consigo mesmo, disciplinado e preciso, quando o diretor se torna um guia que o ajuda a resolver as dificuldades que possa encontrar e a vencer as inibições e condicionamentos. Nesse processo as ações devem absorver toda a personalidade do ator, desencadeando reações de sua parte que lhe permitam
revelar cada um dos esconderijos de sua personalidade, desde a fonte instintivo-biológica através do canal da consciência e do pensamento até aquele ápice tão difícil de definir e onde tudo se transforma em unidade.
Muitas vezes é preciso estar totalmente exausto para quebrar as resistências da mente e banir as formalidades físicas do comportamento. Contatos O ator deve reagir para o exterior, em contato o tempo todo com o espaço que existe em sua volta, com as coisas e pessoas, procurando usar sempre as próprias experiências, reais, especificas, intimas, penetrando no estudo profundo da reações e impulsos do seu corpo. Associações São o retorno de uma recordação exata, que emerge não só da mente mas de todo corpo; o ator deve relacionar as ações concretas com uma lembrança, pois as recordações são sempre reações físicas: foi a pele que não esqueceu, foram os olhos que fixaram, os ouvidos que gravaram. Elas não são simples pensamentos, por isso não podem ser calculadas. Do silêncio O silêncio é algo difícil do ponto de vista prático, mas é de absoluta necessidade no trabalho do ator. Ele gera a passividade criadora – o ator deve começar não fazendo nada, silencio total; isso inclui até seus pensamentos, pois é necessário que o processo o possua. Nesses momentos, o ator deve permanecer internamente passivo, mas extremamente ativo; são reações que desimpedirão as suas possibilidades naturais e integrais. Vá para o subsolo: Grotowski, Jerzy. Em busca de um teatro pobre. Editora Civilização Brasileira. Obra composta de uma série de artigos, entrevistas e comentários de encenação abordando a filosofia e a prática do trabalho do teatrólogo polonês. Em dois dos capítulos são expostos os exercícios desenvolvidos no seu método de treinamento do ator.
Seguimos nessa intensa pesquisa aqui no espaço do Coletivo Amarelo Croata e na Casa das Caldeiras. Trabalho, trabalho e trabalho.
Licença para uns "devaneios":
Estamos chegando em algumas escolhas importantes e sinto definirem-se as margens de três grandes rios que estão prestes a confluir, cada um com suas bagagens e experimentações:
A aplicação e "controle aerado" da pesquisa da dança do "corpo em vida", corpo dilatado, "corpo energético", corpo sutil, "corpo extra físico", "campo que dança o corpo físico";
A pesquisa do "vazio preenchido", do De-Vir, do aqui-agora, do improviso partindo do corpo em experimentação sincera, com algumas marcações referenciais ou não;
A "não interpretação", o ator/canal de passagem, a persona disponível em estado poético, a história acontecendo pela sincera vivência do ator em estado e em relação.
Simplesmente compartilho escolhas e mergulhos que nos propomos, sem nenhuma certeza e muito menos idéias acabadas, essa é a beleza do caminho e o prazer de se poder percorrer esse "entre" tão incerto e inacabado mas tão cheio de possibilidades e tão livre.
Final desse mês de Junho de 2013 abriremos a temporada de ensaios abertos na Casa das Caldeiras com equipe técnica, provocadores, colaboradores, contatos e amigos.
O ESCRITOR RUSSO Liev Nicoláievitch Tolstói (1828-1910), em quadro de Ilia Repin (1891). Liev Tolstói durante Repouso na Floresta. Coleção da Galeria Tretiakov, Moscou
Muitas pessoas já me caracterizaram como louco", escreveu certa vez Edgar Allan Poe
(1809-1849). "Resta saber se a loucura não representa, talvez, a forma mais elevada de
inteligência." Nessa sua suspeita de que genialidade e loucura talvez estejam intimamente
entrelaçadas, o escritor americano não estava sozinho. Muito antes, Platão mostrara acreditar
em uma espécie de "loucura divina" como base fundamental de toda criatividade.
Uma lista interminável de artistas célebres, parte deles portadores de graves transtornos
psíquicos, parece confirmar o ponto de vista do filósofo grego. Vincent van Gogh,
Paul Gauguin, Lord Byron, Liev Tolstói, Serguei Rachmaninov, Piotr Ilitch Tchaikóvski,
Robert Schumann - o célebre poder criativo de todos eles caminhava lado a lado com uma
instabilidade psíquica claramente dotada de traços patológicos. Variações extremas de humor,
manias, fixações, dependência de álcool ou drogas ainda hoje atormentam a vida de muitas
mentes criativas.
SERÁ MERA COINCIDÊNCIA?
No início do século XX, a busca pelas raízes da genialidade era um dos temas mais palpitantes da
investigação psicológica. Cientistas de ponta tinham poucas dúvidas de que certos males psíquicos
davam asas à imaginação. "Quando um intelecto superior se une a um temperamento psicopático,
criam-se as melhores condições para o surgimento daquele tipo de genialidade efetiva que entra
para os livros de história", sentenciava o filósofo e psicólogo americano William James (1842-1910).
Pessoas assim perseguiriam obsessivamente suas idéias e seus pensamentos - para seu próprio bem
ou mal -, e isso as distinguiria de todas as outras.
Sigmund Freud também se interessou pelo assunto. Convicto de que encontraria "algumas verdades
psicológicas universais", analisou vida e obra de artistas e escritores famosos, buscando pistas de transtornos
mentais. Mas foi somente a partir dos anos 70 que Nancy Andreasen, psiquiatra da Universidade de Iowa,
começou a investigar de forma sistemática a suposta ligação entre genialidade e loucura. Participaram de
sua experiência 30 escritores cujo talento criativo havia sido posto à prova na renomada oficina de autores
da universidade.
(Mais sobre Arthur Bispo do Rosário - http://www2.uol.com.br/vivermente/artigos/as_artes_de_arthur_bispo
Fiz esse blog pra postar algumas fotos, histórias e trocar com vocês sobre meu caminho, minhas pesquisas, minhas inspirações. As opiniões são muito bem vindas e me ajudarão a fazer desse espaço mais amplo. Conto com a ajuda de vocês pra tentar deixar esse espaço cada vez mais completo. Beijos